segunda-feira, 3 de fevereiro de 2020

A fúria dos Titãs



Do alto da montanha presencio
Tempestade ao norte e ao sul
Sua eletricidade me causa arrepio
Nuvens densas sob o céu azul
Estas, açoitadas por dois Titãs
com chicotes de prata em chamas
Iluminam-se, deveras espantadas
Caóticas contendas luzentes
que o céu cruzam subitamente
Incomensuráveis estouros ecoam
Violentos, à barreira do som transcendem

Gotas de suor respingam do céu
São milhões delas cintilantes
O monte fica qual uma noiva sob véu
Devido aos esforços dos gigantes
Talvez sejam doces lágrimas
Pois em suas histórias de mil páginas
Deuses guerreiam por aqueles que oram
e no lugar dos mortais, Eles choram
Assim a Terra treme e todo meu corpo
É uma força muito impressionante
Eu, mero mortal, sentir a fúria dos gigantes

quarta-feira, 29 de janeiro de 2020

Onde fica o cemitério?



Rock and Roll, músicas obscuras, sinistras, gênero musical peculiar. Death Metal, Black Metal, Grind Core, Gothic Metal e etc… Uma bela adolescente, rotulada como "roqueira gótica", inteligente, intelectual; com ar rebelde, mas bem caprichosa; boa vivant, uma mulher independente... Esta jovem moça curtia - além das músicas citadas - livros de grandes escritores existencialistas, os de terror também e filmes do gênero. Além do mais, era costumeiro passar a noite em cemitérios com amigos roqueiros em alguns fins de semana. Ela não possuía medo algum enquanto no cemitério ou medo de o que poderia surgir como sobrenatural, sombrio e etc. Afinal seu hobby era lidar com esses assuntos, seja na música, no cinema ou literatura. Tornou-se hábito. 

Então, passaram-se alguns anos.

Eis, numa dessas belas noites no cemitério ela avistou algo disforme, de aparência horrenda no pé do cruzeiro das almas. O ser não refletia luz alguma, muito menos dotado sua própria (natural em visões mediúnicas, em se tratando de seres - como o nome já diz - iluminados); a aparição era muito opaca, muito escura... Se contorcia, como que movimentos parecidos de alguém sofrendo muita dor e, na medida que esvaia, paradoxalmente, se recompunha; ora como uma fumaça, indo em direção ao céu, ora como uma chama preta plasmática se retraindo para o interior da Terra. 

A jovem não conseguia identificá-lo. Sequer via o que poderia ser um rosto claramente; algo como se fosse uma boca aberta como num gesto de um grito doloroso, as mãos saindo do que seria o tórax do ser; "pernas" se debatiam; assim como o que seria a cabeça também. Só a jovem roqueira conseguia ver tal cena, de fato. Ninguém mais. Por mais que ela apontasse, explicasse o que se apresentava a ela, seus amigos não conseguiam enxergar nada além do cruzeiro das almas - que permanecia solitário, solene. Então, ela desmaiou de tanto medo que sentiu. Seus amigos se atentaram à gravidade da coisa, deixaram o lazer no meio da madrugada e levaram-na para casa. 

Enquanto no seu quarto, após muita reflexão, adormeceu como um anjo. Acordou beata. Queimou tudo o que foi discos, camisas e livros. Largou todos os seus costumes, sua ideologia e foi para a igreja evangélica. Só que a coitada ainda permanecia vendo tais fenômenos parecidos com o que viu no cemitério, até mesmo dentro da igreja; ou dentro das igrejas católicas, nos terreiros de umbanda ou candomblé que ela passara a frequentar depois de ter largado a igreja evangélica achando que não solucionaram seu caso. Por onde ela ia, volta e meia, se deparava com cenas e fenômenos de tal natureza. Não só em locais de cunho religioso.

Por fim, o “problema” não era a música, filmes ou os livros - pensava a jovem - muito e seus amigos. Puta da vida, voltou a comprar suas camisas de rock, ouvir suas músicas "pesadas”; voltou a ler seus livros prediletos, assim como os filmes do gênero de terror, suspense… Readotou sua filosofia de vida de outrora, qual era muito feliz e sentia-se viva. Então a pergunta que ficou no ar, por conta dos amigos, foi esta: Vais frequentar cemitérios conosco? Ela respondeu: E por que não? Dentro e fora dele para mim agora é tudo uma coisa só.

segunda-feira, 27 de janeiro de 2020

Trovoada sem estrondo


É no silêncio que minha voz entoa;
retumbantemente afora ecoa,
advinda da mais pura fonte.

Pensamentos — não mais que lamentos,
tormentos, quaisquer ócios do dia —
traduzem-se em música, em poesia.

Fatos de outrora, enevoados,
rompem ansiosamente tais barreiras;
voando como venenosos dardos,
abrem-me à fronte uma clareira.

Momentos dolorosos, tristes,
que no inconsciente dormem,
despertam em minha vigília,
advertindo-me à noção do ser humano.

E, por ser humano, a dor compartilho.
Dói, contudo…
O que seria da alegria, não fosse a dor?
Do perfume, sem a flor?
Ou do dia sem a noite?

Nada é tão desesperador.
Vivem: o infeliz, o injusto e o sádico —
todos em perfeita harmonia.                

domingo, 26 de janeiro de 2020

Então...

Quando eu me sinto assim
Vontade me dá de ficar bem:
As vezes para longe ir
Ou não falar com ninguém

Ir tão longe onde finda o infinito
Ficar mudo como um retórico
Ser aquele feio mais bonito
E o lendário ser sem histórico

Quando assim me sinto 
Nada é menor que meu recinto
A pressão é deveras aviltante
Aos sentidos excita os cinco

Tudo se repete nesta vida
Como um fugaz retorno, enfim
É bom é ruim desde a partida
É ruim é bom até seu fim

quarta-feira, 15 de janeiro de 2020

É muito Bela



Seu sotaque, que ela diz que não tem
Eu noto e admiro cada palavra 
Desde quando ela me liga do trem 
Até saindo pra alguma balada

Um anjo lindo cativante
Dá alegria e tira a dor
Está comigo a todo instante
Por ela canto em louvor

Menina com seus sonhos no céu 
Mulher com os pés no chão
Ela é doce como mel
Mas no frango põe limão

Gosto de com ela compartilhar 
momentos, eventos, notícias 
gestos, carícias…
Coisas simples, de se apaixonar 

Seu véu dourado cai por sobre mim
O céu vem à terra, como numa quimera
Ainda mais quando pergunto assim:
Sorria pra mim, Isabella? 

De Bela ela não só tem o nome
Todo o seu ser, lindo é 
Ela já até possui uma gatinha 
Em sua homenagem, chama-se Belinha

Essa é a guria
Que salva os meus dias
Ora me desejando bom dia
Ora pedindo para me ajuizar
Durmo com ela na minha cama vazia
E sempre com ela acordo após sonhar


quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

É tudo, é nada, é


A minha religião é a Filosofia
Não sei o que de mim seria
Sem o lógos, a phýsis, a arché
Sem a noite deixando de ser dia

Com o Todo, essa ligação
O devir, a transformação
O ser, o não-ser
O ódio, a paixão
A transcendência
Uma nova essência

A falta de recursos 
para se expressar
A limitação da língua 
ante ao pensar
Do que mais preciso?
Decerto nem de água ou ar

É sublime o momento
do belo e curto encontro 
da razão com a emoção
da ação com o pensamento

O que me causa a Filosofia?
A indiferença entre sonho e realidade
Não distinguir a mentira da verdade
A lucidez em pleno tormento
O conforto após o lamento

Que bom é passar os dias
sem notar que eles passam
Sentir-se a síntese da multiplicidade
Mesmo quando só, estar acompanhado
Ou estar, dos mitos, deuses e heróis, rodeado

Ser analítico, dogmático, aporético
Ser a composição do mundo
da contradição, o absurdo
Ter juízos analíticos e sintéticos

Eis o que me dá potência
intuição e experiência 
esperança e nostalgia
A morte e a vida: Oh, Philosophía!

quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

Leia com atenção

Retornando do trabalho, eu me entretia com essas TVs que agora estão dentro dos coletivos. O ônibus, no caso, não estava cheio, mas quase não havia vaga nos acentos. Então sentou-se ao meu lado uma jovem universitária. Eu estava segurando um livro, O 18 de Brumário de Luís Bonaparte, de Karl Marx. A moça reparou-o em minhas mãos, olhou mais atentamente para a capa do livro e resmungou algo como que falando com o teto: “comunistinha de merda”. Continuei olhando a TV - menos concentrado, obviamente. Segundos depois ela vira e pergunta: “Uma mulher grávida pode engravidar?” “Nossa! Você viu aquilo?” - Perguntei-a se realmente ela tivera reparado a mesma coisa que eu na TV. “Sim! Vi” - respondeu. Então comentei: “Olha ai um conceito de ‘devir’". Imediatamente ela me cortou e afirmou: “não na visão desse Marx, obviamente” - desdenhando do autor que eu tinha nas mãos. Perguntei-a se ela já havia lido. Ela disse que não. Cordialmente sugeri: “Leia, então”. Ela se virou espantada e perguntou como eu havia adivinhado seu nome, uma vez que não nos apresentamos. Eu retruquei e disse que só havia pedido para ela ler Marx. Ela insistiu falando que eu disse seu nome. “Leia, Leia! Você falou meu nome sim. Como você sabe meu nome?” “‘Leia’, eu falei sim, mas usei a palavra no verbo “ler”, no imperativo…” - expliquei-me. Então esse era o nome da moça. Verbo ler no imperativo, ou seja, Leia. “Era para ser Leia, com acento agudo na letra E, mas meus pais não se expressaram bem, creio” - explicava-se a jovem. Mas a curiosidade transmitida na TV do coletivo já tinha viralizado. Tal curiosidade era, que até o motorista parou o veículo para perguntar a uma fiscal da linha que estava no ponto de ônibus: “mulher grávida pode engravidar?” Um homem sentado no banco de trás, questionou-nos, dizendo que eu estava errado e que o caso de uma grávida vir a engravidar, se encaixava com o célebre pensamento de Sartre, onde diz que estamos condenados a ser livres. A Leia, sabiamente respondeu: “Que condenação é essa?” O homem ficou sem resposta. Irônica, novamente, ela resmungou fazendo cara de desdém: “essa condenação se dá somente pelo fato de termos nascido, pronto! Quanto à liberdade, esta seria, vamos dizer, um brinde extra.” “Qual seu nome?” - perguntou o novo interlocutor, curioso. “Leia” - disse ela. “Tá bom, vou ler” - respondeu o homem instintivamente -, “mas queria saber teu nome moça”. “Leia” - já disse. “Ler aonde, colega?” - se questionava o homem. “Deixa pra lá” - finalizou a moça.

Apolítica

Um ato de violência política não revela apenas um crime de uma ação isolada. Ele expõe a fragilidade de nossas crenças políticas. Depois dos...