domingo, 17 de agosto de 2025

ATUALIZAÇÃO BETA v.5.7.0: AGORA MEUS ELETRODOMÉSTICOS SÃO PÓS-ESTRUTURALISTAS

Dizem, os pós-estruturalistas, que a linguagem constrói a realidade. Isso é ótimo, exceto nos dias em que eu preferiria que minha realidade viesse pirateada, com todas as etapas e funções desbloqueadas, atualizadas e traduzidas para o grego, enquanto eu descansava em minha mansão de frente para o mar Egeu.

De volta ao Oceano Atlântico, mais precisamente à Baía da Guanabara, é de se admirar tamanha ousadia: o pós-estruturalismo nos prega situações dignas de… se amar. Sabe-se que tem aquele gajo que é viciado em leitura — e até aí, tudo bem. Mas, convenhamos… Passar 24 horas por dia agarrado às brochuras dos cânones franceses pós-modernos, como se a retina estivesse em ininterrupta sociedade com a benzoilmetilecgonina, é dose! Essas e outras situações foram constatadas, pelo menos nos últimos 4 anos, que tais indivíduos chegavam a níveis transcendentais a ponto de uma socialista-psicóloga ter que consultar a bibliografia inteira de Michel Foucault antes de postar que o verbo “vencer” é opressor demais para ser enunciado.

Se Foucault, se estivesse vivo, provavelmente teria um canal no YouTube e uma conta no Instagram para explicar como o poder opera por meio dos stories e reels.

O pós-estruturalismo oferece ótimas ferramentas para desvelar o mundo como ele é e escancarar toda sua complexidade fluida - e asquerosa. Imaginem só, um mundo moldado por uma pessoa que não para de tagarelar coisas aleatórias? Numa hora tu estás diante do belíssimo Estádio do Flamengo lotado por sua torcida. Daí, você se vira. Poucos segundos depois, quando você olha de volta, dá de cara com uma imponente mesquita com arquitetura da “Magic Kingdom” da Disney World; ao fundo uma imensa roda-gigante, enquanto que os líderes religiosos vestidos de Mickey Mouse, MC Pipokinha, Bumblebee e Optimus Prime, andam pra lá e pra cá pregando aos berros: Meditem! Meditem!

Partindo disso e admitindo que o discurso constrói a realidade, temo que o meu mundo tenha sido erguido sobre fundamentos linguísticos por ordens diretas do tipo “Vai chupar um canavial de rola”. O resultado seria uma civilização peculiar, em que o setor primário da economia teria forte apelo oral e as aulas de geografia envolveriam mapas agrícolas extremamente constrangedores. Imaginem! Até uma Bolsa de Valores de commodities, só que com cotações baseadas em produção de… Bem, prossigamos.

O pós-estruturalismo já nos avisou também: não existe significado fixo, permanente. O que há, de fato, é só um jogo infinito de interpretações. Traduzindo para a vida prática: você nunca sabe se a pessoa disse “Vá chupar cana” ou “Vá chupar rola”. E ainda tem gente que acha que isso é um problema moderno. Não, é um problema antigo. Desde a época das primeiras civilizações, dos nossos antepassados longínquos. Evidentemente, o vulgar “vá chupar um canavial de rola” já foi proferido pelos mais diversos idiomas, pelas mais remotas civilizações. Só que agora as redes sociais deram ao discurso o equivalente a um megafone interplanetário.

Pois é! Vivemos em um tempo onde o discurso não é apenas o que você diz à algumas pessoas, mas o que você posta e o mundo inteiro lê ou vê imediatamente - e, mais recente ainda, agora o mundo inteiro fica perplexo diante das conflitantes peripécias que a Inteligência Artificial produz. Sem contar o fato de que o que você posta não é exatamente o que você quer dizer, mas o que você acha que ficará bonito com um filtro e a mesma dancinha de sempre, é claro! É a “vida de plástico” - conceito de Zygmunt Bauman; já eu, chamo de “mundo rosa” -, aquele em que todos estão felizes, são inteligentes e incrivelmente bem iluminados. E o que ilustra muito bem são o Instagram e o TikTok. Eis a nova Metafísica: todos têm uma essência muito próspera e meticulosamente editada por filtros, efeitos e, claro, discursos/ linguagens vazias sob uma dancinha asquerosa.


Como chegamos até aqui sem problemas, sem ofender uma nação inteira e sem alterar qualquer tipo de realidade com base nestas 1793 palavras que formam meu discurso, entra aqui uma confusão: como saber se um discurso é real ou se ele é só som articulado aleatoriamente distante da realidade? Alguns filósofos diriam que não existe “real” sem o “da boca pra fora”, porque tudo é mediado pela linguagem. Só que isso não resolve meu dilema quando uma amiga diz “passa aqui em casa qualquer dia” - eu não sei se devo levar vinho ou uma caixa de ferramentas.

Bem, ferramentas como estas são coisas do passado. Nos dias atuais temos como aliada a Inteligência Artificial, mas só para complicar a nossa vida mesmo. Pense bem: um sistema que pode gerar discursos infinitos, convincentes e — ocasionalmente — mais coerentes do que qualquer produção humana, exceto a produção de capinhas coloridas para smartphone em Taiwan. O que significa “autenticidade” quando até uma máquina pode escrever um tratado convincente sobre ética animal? - incluindo nós, humanos.

Há! E vocês acham que eu estou vacilando? Eu mesmo perguntei a um ChatBot (IA) se ele acreditava que o discurso é capaz de construir a realidade. Ele respondeu que sim. O discurso é capaz, além disso, lhe envio um arquivo completo sobre o estudo. Apreciei tudo por meio de dezesseis laudas, vinte e seis citações e… nenhum emoticon. Fiquei impressionado e, ao mesmo tempo, um pouco humilhado. Pois é! Mesmo com toda essa tecnologia. Isso porque eu, humano, razoavelmente dotado de função cognitiva e extremamente emotivo, não fui capaz de escrever mais que dois parágrafos sobre - nem mesmo buscando por fontes de autoridades no assunto - o que prova, paradoxalmente, que eu também não ser ler (mas meu último ENEM foi 900).

Em seguida, repensei o que havia dito. Se Michel Foucault estivesse vivo, talvez dissesse que o poder agora está nos algoritmos e que, além de tudo, decidem qual discurso você verá. “Eita! e não é que ele pode ter razão?” - me espantei. “Digitar e Punir” seria sua mais explosiva obra. Em suma, os vilões, ou os opressores do mundo virtual, iriam deixar escapar somente obras que nos torturassem. Manuais de como se tornar exatamente aquilo que o partido político deseja — geralmente artigos, papers ou publicações em geral de alunos de qualquer curso que contenha a palavra 'Social' no nome; no topo da lista estaria O Manifesto Comunista — o mais torturante e, paradoxalmente, o mais eficiente — por um preço absolutamente especial! Sem esquecer, é claro, de qualquer obra disruptiva da corrente pós-estruturalista que trate de ideologia política ou de pautas alinhadas ao Greenpeace.

Derrida, nascido na Argélia e também cidadão francês, provavelmente desconstruiria os feeds do TikTok, mostrando que todo vídeo de gatinho é, na verdade, segundo o seu conceito de “différance”, uma expressão do desejo humano de comer pouco e dormir - conceito derridiano esse que é crucial para a formação da significação do ente objetivo. Por sua vez, o Roland Barthes, da escola estruturalista, mataria o lado autor do filósofo franco-argelino e ressuscitaria seu lado influenciador - que, realmente, seria bem mais lúcido.

A ironia é que vivemos num momento em que nunca se falou tanto… e, em contrapartida, nunca se entendeu tão pouco - sobretudo quando se articula verbos sob o tempo Futuro do Pretérito do Indicativo. Mas não é por causa de conjugações verbais que não se têm entendido muito, na verdade é um carnaval de neologismos e significantes flutuando pelo ar, como balões de festa que escaparam e agora sobrevoam um abismo existencial pra lá e pra cá. Por exemplo, a cada vez que abro o Twitter (me desculpe, “X”), tenho a sensação de estar participando de um debate onde todos estão gritando dentro de um elevador que só possui a função “descer”.

Cabe ressaltar também que assembleias, debates e diálogos quaisquer estão se esvaziando de significado, tornando-se meros mugidos ritualísticos, onde palavras são proferidas não para construírem consensos ou promoverem reflexões, mas para cumprirem pautas partidárias e ideológicas, reafirmarem posições já cristalizadas que não vão mudar a posição de ninguém, além de alimentarem a vaidade de quem fala mais alto, sem que nada de substancial se converta em uma transformação objetiva. Além disso, com base no cenário social em que nos encontramos, recebemos, de brinde, a relativização — que agora serve como arma de ressentidos que mal compreendem a etimologia da palavra “todo” ou sequer a si mesmos.

Esse relativismo barato cresceu até virar recorde no Guinness. São pessoas que compõem a colcha de retalhos social, formada por grupos militantes das mais diversas causas, que mal conseguem se assimilar sob circunstância alguma, sobretudo, antes de mais nada, pelo fato de todos serem humanos. Vejam, a relativização está tão exacerbada atualmente que se distorce completamente a lógica para inverter papéis ou justificar o injustificável. Por exemplo, tem quem se ache comunista antes de ser propriamente humano - “humano” entre aspas, dirão; há também quem diga que é a favor do assalto, porque vê ali uma lógica que justifique tal ato - “lógica” que possui lado, ressentimento e indignação seletiva.

A vida moderna é basicamente um pós-estruturalismo de bolso: a qualquer momento você saca uma retumbante prosopopéia de que “não há verdade universal, apenas versões conflitantes de épocas distintas”, cada qual com um emoji apropriado. E talvez seja por isso que a Filosofia e o humor funcionam tão bem juntos — ambos lidam com a única certeza que temos: a de que tudo isso é profundamente incerto e que ninguém concorda com ninguém - nem mesmo, antes de mais naada, com o fato de todos sermos humanos; e o mais esquisito - sim, mais esquisito que o fato de sermos todos humanos - é a dissonância que existe na opinião da população diante de um evidente caso de corrupção na política: o corrupto, o criminoso safado, sob provas cabais de seus atos, na verdade, é sempre um inocente vítima de um golpe.

Então, sim, a fala constrói a realidade. Agora, se todos mentirem, o mundo será uma mentira? “Veja bem…” - dirão os pós-estruturalistas antes de soltarem uma mentira - “antes de mais nada, não existe uma verdade absoluta.” Pois bem, dessa maneira, se todos mentirem, então a mentira será a única verdade. Nesse caso, estou perfeitamente adaptado. Passei anos dizendo a mim mesmo que ia fazer dieta, que iria, sim, estudar persa, além de sempre avisar ao ministro da defesa iraniana que eu era talentoso com fórmulas químicas. A única diferença é que, quando o mundo inteiro mente, chamam isso de filosofia pós-estruturalista; quando eu minto, chamam de baixa autoestima - ou esquizofrenia.

Mas, considerando as últimas conversas que tive no WhatsApp, começo a achar que seria melhor se fôssemos todos mudos e nos comunicássemos apenas com olhares. Ao menos assim teríamos a chance de um silêncio confortável e a possibilidade de olhar mais nos olhos uns dos outros. Mas, como me disse uma amiga que estudou Derrida: até o silêncio é um discurso. A única diferença é que, no silêncio, ninguém curte seus vídeos ou sequer pode ouvir sua mensagem de doze minutos no whatsapp.

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ATUALIZAÇÃO BETA v.5.7.0: AGORA MEUS ELETRODOMÉSTICOS SÃO PÓS-ESTRUTURALISTAS

Dizem, os pós-estruturalistas , que a linguagem constrói a realidade. Isso é ótimo, exceto nos dias em que eu preferiria que minha realidade...