Porrezinho n⁰ 8 - pesado como um livro de Filosofia

Morte de Sócrates


Entre assaltos, brigas de vizinhos, gritaria das pessoas na rua, carros e motos barulhentas, cheiro de maconha que vem de perto; os xingamentos inofensivos e as gotas da chuva tocando as folhas… - ah, eu já me esquecia da música ao vivo, no bar, que está enchendo o saco - é, então, possível, em meio a isso tudo, um mero ser humano tentar achar no livro 1, da República, de Platão, a definição mais justa de Justiça? Sem contar que toda hora se é interrompido por uma voraz tendência, um pensamento fixo de como dar cabo à vida. "Existe Cianeto, Sarin, faixa de quimono, cinto, vidro quebrado, os punhos e os pulsos cortados; heroína, crack e cocaína." Se bem que essas três últimas belezinhas são até legais, porém podem não dar cabo sem deixar antes um sofrimento horroroso.

O que seria mais justo em prol da salvação da vida dessa pessoa? Os itens supracitados ou tentar, com alguma fé religiosa, se fazer de coitado? Buscar Deus, se livrar dos pecados ou qualquer bosta ideológica qual a mão esquerda sabe o que a direita escreveu? Ah, psicanálise! Massagem, sauna a vapor! Cristais, mantras! Futebol, séries, filmes, livros de romance, amor… Em meio a isso tudo, a julgar essa dúvida toda a coisa mais justa a se fazer seria manter-se vivo, no além (entendam "além" das maneiras que vocês quiserem).

Se bem que: entender Justiça, em Platão, e também na visão dos Sofistas, é como beber cerveja. É tão fácil como mandar alguém à merda. Da mesma forma como é fácil, também, se auto destruir. Contudo, as ferramentas ou o meio de como realizar tal ato, é que dificulta a práxis. Essa ferramenta nada se compararia à alegoria da Caverna, porque, de fato, ao invés de matar a pessoa ia viver mais e mais em sofrimento (risos). Portanto, mas não o fim, na "merda" da República, uma vez que fica definido o que é justo (ou não - diga-se de passagem. Cabe ao leitor definiar por si e por sua própria conta) fica agora complicado saber se, se deve e/ou como faz para "tirar a própria vida." Porque, primeiramente, sabe-se que é justo demais não se ferir ou ferir o próximo; assim como também é injusto demais viver ferido ou se ferindo; é justo o coração pulsar e injusto fazê-lo parar, mas deixá-lo batendo sem um propósito, sangrando, cheio de dor? Assim não dá.

Enquanto há um mundo lá fora, as coisas se misturam, fluem e desfazem-se, vão e vêm; enquanto as crianças na praça gritam, não de desespero, mas de uma inocente brincadeira; enquanto a chuva cai e o vento sopra... Ou melhor! Nem mais chovendo está. Na verdade são aquelas gotas presas às folhas, temisoas, que não resistem ao vento, dando a sensação de as árvores estarem chorando junto. Enquanto as lágrimas caem e a brisa ao rosto toca, impera o impasse entre dar aquele último passo ou começar tudo de novo. Essa esquizoidia, que: entre matar ou viver, acaba-se por viver de forma morta. 

Ademais, há a sensação de que o cosmos ficou preso. Como se não houvesse ar, ou espaço vazio. Seria uma "harmonia dos contrários", de Heráclito, às avessas. Sentimento de onde os conflitos não geram nada - até porque não há conflito. A tese e a antítese não geram nenhuma síntese mais mundo afora. Está tudo parado, tudo estático, mudo, estarrecido e... Doentio? Será que o "saudável", com esses meus conflitos, sou eu? Que se toquem as sete trombetas: nada se movimenta, nenhum pensamento, nenhum coração pulsa e nem mais, no papel, escreve essa caneta. Acabei de ser libertado.

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